Se você tem mais de 30 anos com certeza já deve ter se deparado com alguém da família, geralmente bem mais velho, que se vangloria de ter passado a vida toda em um único emprego – inclusive quando não era, exatamente, o emprego dos sonhos.
O motivo de orgulho é bem claro: as pessoas costumavam se preparar para garantirem a vaga até o fim da vida, gozar de uma carreira minimamente estável e sonhar com a aposentadoria. Esses eram os objetivos de quem tem, hoje, um pouco mais idade do que você.
E é geralmente por isso que, muitas vezes, somos incompreendidos quando dizemos que queremos abrir um negócio próprio.
Quem sempre se acostumou a receber o salário em dia (ou quase isso) e não levar trabalho ou preocupações pra casa (ou quase isso) acha estranho ver que toda uma geração parece, exatamente, querer mais: mais dor de cabeça, mais trabalho… e, consequentemente, mais dinheiro.
E, para quem vive do lado de cá, sonhando com o dia em que vai ser administrador de si próprio, um obstáculo se coloca entre o desejo e sua realização: a maioria esmagadora das pessoas não está preparada para ser chefe de si mesma.
As novas carreiras, muito voltadas ao mercado freelancer, são a forma encontrada por pessoas ávidas por mais condições financeiras e qualidade de vida a conquistar essas duas metas. Afinal, fazer seus próprios horários, trabalhar de casa, ter poder de decisão e não perder tempo com projetos que não significam absolutamente nada para uma carreira profissional são os ingredientes perfeitos para a receita de sucesso.
Contudo, ao contrário dos avós e pais que perseveravam em um único emprego para garantir o melhor às famílias, uma coisa falta aos administradores de si próprios: a paciência.
Todo mundo quer esse combo de coisas boas, mas ninguém quer esperar por isso. Além do mais, tem-se uma ilusão generalizada de que os freelas tem uma vida melhor, mais tranquila, enquanto quem trabalha no escritório está sendo escravizado sem precisão.
Como diriam os pais e avós do passado, devagar com o andor: é preciso disciplina, persistência e um foco absurdo para que administrar uma carreira de freela seja um indicativo de sucesso.
Do office para a home
O primeiro suspiro de quem ainda trabalha em escritórios físicos, quando fala com alguém que já faz sua própria carreira, é sobre trabalhar de pijama. Isso mesmo: de todas as coisas que as pessoas podem pensar, a maior parte delas vai se iludir com o fato de que o freela não precisa acordar cedo e nem trocar de roupa.
Abriu os olhos e, pronto, está no escritório.
Isso não deixa de ser verdade – mas também não é tanto uma vantagem. A pessoa que mora onde trabalha tem diversos problemas para dissociar uma coisa da outra. Às vezes, exagera no lazer, quando deveria estar trabalhando, ou não para de trabalhar, mesmo na hora do descanso.
Enquanto se é jovem e cheio de energia – e os clientes não reclamam sobre prazos e entregas –, isso dificilmente será considerado um problema. Mas depois de cinco, dez anos nessa toada, o corpo cobra o preço.
Portanto, a primeira dica para administrar a si mesmo sem perder o controle sobre “a equipe” é fazer o possível para separar o que é home office do que é só home. Não pode trabalhar de pijama, nem com o computador em cima da cama, nem na sala de televisão. Eleger um quarto ou um canto para fazer dele seu escritório é a melhor forma de dissociar os papéis.
Aí começa, também, a parte da disciplina, inerente a todos que querem ser bem sucedidos em sua carreira freelancer. Se você não tem alguém pra te falar o que fazer toda hora, isso significa que você é seu próprio chefe.
Então, é necessário ser o mais exigente possível consigo mesmo.
Sem um superior ou uma equipe para te dar feedback, dificilmente você entenderá sozinho que pode fazer melhor do que faz atualmente. E, quando o sono apertar e você se der uma manhã inteira de descanso, é preciso saber quem pagará o preço por isso.
Na vida de freelancer não tem atestado, folga não-programada ou falta sem justificativa. Bem ou mal, você responde por tudo o que seus clientes pensam e esperam de você.
Por fim, para quem não é um administrador nato, a parte mais difícil de se adaptar a novas carreiras é entender o que é da empresa e o que é da pessoa, principalmente no quesito financeiro, uma vez que, ao virar freelancer, pessoa e empresa se tornam uma coisa só.
Nesse caso, é imprescindível ter um bom fluxo de caixa e evitar pegar dinheiro da empresa emprestado, além de injetar valores como investimento e, assim, ter um bom planejamento de retornos.
O melhor é abrir um CNPJ, seja MEI ou Microempresa, e fazer uma conta bancária jurídica para separar faturamentos de recebidos. Como nem sempre o empreendedor tem noções de administração, essa é uma dica que acaba ficando pelo caminho.
No mais, o negócio é não se deixar abater: ser o seu próprio chefe é uma decisão desafiadora e instigante, com muitas pedreiras, mas também muitas alegrias, pela frente.
Assim como outras coisas tão importantes quanto o trabalho, ser freelancer é um eterno recitar do “vivendo e aprendendo”. Aos poucos você conseguirá administrar sua própria carreira e tomar nas mãos o rumo das suas escolhas.